A rapariga movimentava-se de forma expedita e preparava tudo ao pormenor. Trazia uma toalha envolvendo a cabeça o que lhe conferia um ar afélio em relação ao resto dos convivas. Com gestos precisos desconjuntou um pão de centeio em várias fatias paralelas e alvas. Os bordos requeimados ainda suplicavam por mais. Assim, dispo-las numa grelha e enfiou-as no forno. Dois minutos mais tarde a rapariga da toalha na cabeça abriu o forno e virou as fatias. Um cheirinho simpático invadiu o ar e soltou as salivas. Mais um pouco e estavam prontas. Serviu-as com queijo fresco, farinheira, rodelas de chouriço e tudo o que mais se alembrou.
Nessa noite, enquanto degustávamos os petiscos, explicou-nos que as pessoas só existem para o futuro. Demonstrou que se parássemos o mundo e todos paralisássemos não haveria ninguém que se importasse de morrer naquele exacto momento por ter atingido o pleno da sua felicidade. E procurou esclarecer que em cada momento ninguém é feliz. Que, isso sim, almeja a felicidade futura. E que cada momento é uma antecipação da felicidade que está para vir, cada fatia de tempo depende da anterior e da subsequente, e que vivemos todos num contínuo de sensações com vista à sensação seguinte. E que quando estabelecemos um objectivo e mais tarde o vamos atingir, nessa altura o nosso objectivo já é outro que entretanto apareceu no meio. E isso explica a nossa insaciabilidade.
Tudo isso sem nunca tirar a toalha da cabeça e sem nunca perder o ar afélio, sem nunca esmorecer o seu plácido discurso e sem nunca deixar esfriar as torradas feitas no forno.