Música é aquilo que fazemos com o som “cá dentro do nosso cérebro”. E a compreensão que temos desse som. Se o som não contiver em si nenhuma associação prévia, nem fizer sentido, vai ser encarado como ruído e não como música. Por outro lado quando um “som tem sentido” é encarado como música.
Para um “som ter sentido” precisamos de utilizar a imaginação para alcançar a metáfora, o lugar onde verdadeiramente reside a música: como uma expressão metafórica das experiências de vida, e aí, de certa forma, aproximo-me de wittgenstein e dos seus jogos de linguagem e a ideia que a nossa compreensão do mundo está de certa maneira ligada à maneira como aprendemos a língua e os símbolos com os quais manipulamos e construímos raciocínios.
Para “acontecer música” e “acontecer música de determinada maneira” é necessário que toda uma experiência de vida se vá construindo e como ela uma rede de associações simbólicas e consequentemente emotivas. Haverá certas associações (a maioria) que decorrem naturalmente por aculturação, outras por analogias (flautas a fazer trilos e o canto dos pássaros será uma analogia, já uma celesta ou uma caixinha de música estar relacionada com fantasia, sonhos, crianças é uma convenção cultural adquirida e repetida ao longo de muitos anos, não há razão nenhuma aparente para tal associação).
Muitas destas associações culturais iniciam-se de forma “ostensiva”. Poderá não ser “apontando directamente” mas subtilmente. Se eu dou um título ou uma determinada letra ou um programa, informação extra-musical, de certa maneira estou a embeber ostensivamente convenções naquela música. Se eu digo “balada melancólica” ou “o pássaro de fogo” estou a convidar à partida o ouvinte para ele embarcar numa emoção ou num conjunto de emoções que eu pretendo que ele sinta, que se calhar ele nunca iria sentir sem essa informação extra-musical.
Outras há que são criadas por associação. Se eu dei o meu primeiro beijo ao som de uma determinada música, sempre que a ouvir, ou ouvir músicas com características semelhantes irei recordar e trazer à tona essa emoção (ou emoções da área dela).
Um indivíduo que não viva na mesma cultura que nós, não tenha os mesmos símbolos, não apreenda o mundo desde pequeno da mesma maneira não vai encontrar estas referências. A quinta sinfonia tocada de chofre para nativos Africanos soou como cacofonia inolvidável e assustou-os. Conversamente música batucada e entoada por nativos africanos para nós poderá soar despropositada, desafinada, e não evocar nenhuma emoção idêntica à que eles sentem.
Em suma: a emoção na música reveste-se de um processo metafórico e simbólico que resulta de um processo cultural e de construção da memória e identidade do próprio indivíduo enquanto ser-no-mundo. E é esse processo que vai determinar as emoções que iremos sentir quando ouvirmos determinados processos musicais. E é conhecendo-os e por vezes manipulando-os que conseguimos criar clichés que sabemos que resultam dentro de certa cultura porque são comuns àqueles indivíduos.