Estilo e Repetição (in Portuguese)

«Quando se repete a fórmula, já não sabe tão bem como à primeira.» – Sonia dixit, a propósito do álbum “Tabarly” de Yann Tiersen. A mesma Sónia que se desiludiu com o seu segundo poema musicado por mim, talvez por ter mais do mesmo, também.

Nesta hora apressada do mundo em que vivemos parece que procuramos estímulos mais duros e mais fortes que nos façam acordar e viver. É uma necessidade incessante de novidade, de coisas frescas. A repetição é um tédio. Parece que “cai mal” fazer a mesma coisa.

Mas o que é a música senão repetição? Senão clichés uns atrás dos outros? Aliás, quanto mais “nova” é a música pior é sentida. Porque, no extremo, não vai de encontro às expectativas e necessidades do ouvinte. «Onde está a cadência?», «Onde está a harmonia?”», «Não percebo esta música, isto nem é música». São afirmações vulgares. Dentro da nossa cultura construímos determinados preconceitos e expectativas sobre como uma coisa deverá ser. E quando nos sai algo completamente diferente poderá dar para muito torto. Simplesmente a mensagem não passa. É este o destino de muita música contemporânea: esbarra nas nossas convicções do que “uma música deve ser”.

Como encontrar um ponto de equilíbrio? Confesso que também eu fiquei um pouco desapontado com “Tabarly” quando o ouvi à primeira. Pensei que estava a ouvir o “Good bye Lenin” outra vez. Ou o “Amelie”. Mas depois quando pensamos em todos os Nocturnos de Chopin. Ou as Valsas. Ou os concertos de Vivaldi. A sensção já não é tão estranha. São obras de toda uma vida. E são todas “iguais”. Marcam por aquele cunho, aquela assinatura. Como as ouvimos já todas de enfiada, todas já prontas, e não ao longo de quarenta anos achamo-las todas consentâneas e muito bem estruturadas.

Com Yann Tiersen o fenómeno é o mesmo. O problema é que os álbuns ainda não estão todos prontos. Yann terá provavelmente mais trinta anos para fazer “mais do mesmo”. Fazer o que sabe fazer melhor. E se hipoteticamente pudéssemos escutar toda a sua obra, essa sensação de mais do mesmo já não aconteceria. Acontece agora porque a estamos a absorver no momento, conforme vai sendo debitada. Tarefa ingrata a de um compositor ainda vivo.

Cada álbum de Rodrigo Leão foi uma brisa fresca no panorama português. No entanto, quando ouvi as novas séries Portuguesas, com sua música ao fundo, pensei «Parece que já ouvi isto nos álbuns». Leva a crer que os álbuns de Rodrigo Leão futuros serão, também eles, cópias dos anteriores.

E quanto não acontece isto na música pop? Tudo igual, tudo com as mesmas fórmulas e sonoridades. Vivemos de subtilezas. A diferença está nos detalhes, porque na grande forma, tudo pertence ao mesmo cerne. E isto é necessariamente mau? Não me parece. Ao exigirmos novidades a cada álbum estamos a transformar um compositor numa manta de retalhos. Fará sentido no final de uma vida termos 10 álbuns todos diferentes em que não distinguimos o Yann do primeiro, do segundo, do terceiro? Fará sentido ter 10 Yanns? Onde se conserva a identidade? Já dizia Wittgenstein que o «Estilo é o Homem, ele próprio.»

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